Vídeo: Câmera corporal contesta versão de PM e mostra como jovem realmente foi morta após coronhada

Na delegacia, o agente disse que o irmão da vítima tinha dado um tapa na arma, provocando o disparo

Uma gravação feita pela câmera corporal do sargento Thiago Guerra, da Polícia Militar de São Paulo, revela que a morte da adolescente Victoria Manoelly dos Santos, de 16 anos, foi causada por um disparo acidental ocorrido logo após o policial atingir o irmão dela com uma coronhada. O caso aconteceu em janeiro deste ano, no bairro de Guaianases, na Zona Leste da capital paulista.

A versão apresentada inicialmente pelo PM diverge do que foi registrado nas imagens. Segundo boletim de ocorrência, o sargento afirmou que o disparo ocorreu após Kauê Alexandre dos Santos Lima, irmão da vítima, dar um tapa na arma enquanto tentava se esquivar da abordagem. No entanto, o vídeo obtido pela TV Globo e anexado ao processo pelo Tribunal de Justiça em 28 de maio, mostra outra realidade.

Na gravação, é possível ver que Kauê estava com Victoria e outros familiares em uma praça do bairro após sair do trabalho em uma adega. O grupo teria se aproximado de uma movimentação policial para ver o que estava acontecendo. A equipe do sargento Guerra havia sido acionada para atender uma ocorrência de roubo e fazia buscas por suspeitos na região quando abordou Kauê. Durante a abordagem, o jovem teria sido puxado pela gola da camiseta, e disse: “Tira a mão de mim”. 

As imagens mostram o momento em que a jovem foi atingida com um disparo. (Foto: Reprodução/TV Globo)
As imagens mostram o momento em que a jovem foi atingida com um disparo. (Foto: Reprodução/TV Globo)

Em seguida, o policial aponta a arma para Kauê e o atinge com uma coronhada na cabeça. No mesmo instante, a arma dispara e o tiro acerta Victoria no peito. A adolescente foi socorrida ao Hospital Geral de Guaianases, mas não resistiu ao ferimento.

O vídeo também mostra o desespero da mãe dos jovens, Vanessa Priscila dos Santos, que acompanhava toda a cena. “Mataram a minha filha”, gritou ela ao tentar pedir ajuda. Ainda no local, Kauê foi detido pelos policiais e só soube da morte da irmã quando já estava na delegacia. Atenção! Imagens fortes:

A Secretaria da Segurança Pública (SSP) confirmou que o sargento está preso no Presídio Militar Romão Gomes. Segundo a pasta, as investigações das polícias Civil e Militar foram concluídas e encaminhadas à Justiça, com as imagens da câmera corporal anexadas ao processo.

A defesa de Thiago Guerra, representada pelo advogado João Carlos Campanini, afirmou que o policial mantém a versão registrada no boletim de ocorrência: “A defesa aguarda decisão do juiz acerca da fase de pronúncia. A instrução de primeira fase já foi finalizada”. 

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Inquérito conclui dolo eventual

O inquérito da Polícia Civil, que investigava a morte de Victoria, concluiu que o sargento agiu com dolo eventual – ou seja, assumiu o risco de matar – ao agredir o irmão da jovem com uma coronhada enquanto segurava uma arma de fogo. A investigação foi conduzida pelo delegado Victor Sáfadi Maricato, que afirmou que esse tipo de conduta não está de acordo com “as doutrinas das polícias brasileiras”.

Por essa razão, o agente foi indiciado por homicídio. Após o ocorrido, ele foi preso em flagrante e teve a prisão convertida em preventiva pela Justiça.

O caso aconteceu em Guaianases, zona Leste de São Paulo. (Foto: Arquivo pessoal)
O caso aconteceu em Guaianases, zona Leste de São Paulo. (Foto: Arquivo pessoal)

No relatório final, a Polícia Civil destacou que a decisão foi baseada em “elementos de convicção apresentados no bojo do presente procedimento de Polícia Judiciária, notadamente os depoimentos dos Policiais Militares, os depoimentos das testemunhas, a declaração da vítima e, primordialmente, o vídeo da câmera de segurança do PM autor do disparo, evidenciam de maneira inequívoca os suficientes indícios de autoria e a materialidade delitiva exigida pelo tipo penal”.

Desabafo da mãe

A mãe de Victoria lamentou a perda da filha e disse que espera que o policial seja punido de forma severa: “Fiquei sabendo que ele está preso. Ele precisa pagar pelo que ele fez, porque não é justo a minha filha pagar por uma coisa que não fez. Pagar com a vida ainda. Mesmo que tivesse feito, ele não tinha o direito de tirar a vida de ninguém. Que ele fique muitos e muitos anos [preso]. A gente não tem mais nada. Só restam saudades e lembranças boas, e ruins também. Porque vi a minha filha sangrar até a morte”. 

"Ele precisa pagar pelo que ele fez", desabafou a mãe da vítima. (Foto: Reprodução/TV Globo)
“Ele precisa pagar pelo que ele fez”, desabafou a mãe da vítima. (Foto: Reprodução/TV Globo)

Vanessa também falou sobre a personalidade de Victoria e relembrou da jovem com carinho: “Era uma menina super alegre, divertida. Ainda não pensei sobre tudo isso. Não raciocinei sobre. Nem acreditar estou conseguindo. Está difícil. Ela era muito divertida, gostava muito de brincar. Vaidosa, bastante vaidosa. Gostava bastante de maquiagem e essas coisas”. 

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Ela também criticou a atuação dos policiais no momento do socorro. “Foi muito feio, foi a pior coisa da minha vida, jorrou sangue, e eles (PMs) não levaram, não a socorreram. Pedi pelo amor de Deus. Ajoelhei ao pé do policial para ele socorrer minha filha. Eles não socorreram. Eles estavam preocupados em colocar meu filho dentro da viatura”, concluiu.

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